Parei meu carro num cruzamento com a Avenida Nove de Julho e logo vislumbrei um paraplégico em sua cadeira de rodas, com um tabuleiro de guloseimas no colo (chicletes, balas, chocolates) vindo em minha direção.
Eu não gosto de dar dinheiro aos pedintes que se postam nos faróis, mas naquele caso, vi que o homem estava trabalhando e me compadeci. Tirei algumas moedas que estavam no console do carro e ia despeja-las nas mãos daquele homem, mas ele me perguntou o que eu desejava comprar. Eu disse que ficasse com as moedas, pois queria ajudá-lo, não queria doce algum por ser diabético.
O homem se negou a receber as moedas e me passou o maior sermão.
__ “Meu amigo, eu vivo do suor do meu trabalho, tenho casa própria, família, meu filho é guarda mirim, não estou aqui pedindo esmolas.” Comecei a achar que aquele indivíduo era soberbo, arrogante, orgulhosos, mas ele me pediu desculpas.
Meu senhor, disse o homem, não dê dinheiro a ninguém nos faróis. Quem quer, pode trabalhar para sobreviver sem explorar suas limitações para obter a compaixão alheia.
O sinal abriu e eu saí dali meio sem saber o que tinha acontecido, mas depois, pensando bem, vi que aquele homem estava com a razão.
Ter pena de uma pessoa com qualquer dificuldade de locomoção ou qualquer outra necessidade especial é uma espécie de preconceito. Devemos respeitar as limitações das pessoas mas respeitar, sobretudo, sua capacidade para empreender aquilo a que elas mesmas se propõem a fazer.
Me recordei que tive um funcionário que foi aprovado no concurso de escrevente e que só dispunha de uma mão, mas me ajudava nas audiências sendo um excelente escrevente de sala e nosso trato era, quando lhe desse algo que fosse impossível, que me falasse. Sabe de uma coisa? Ele nunca alegou impossibilidade para realizar qualquer tarefa.
Aquele sermão no semáforo funcionou como um divisor de águas para mim.